
Política
Os 84 anos de Pacajus, além dos aspectos culturais, históricos e econômicos, são alimentados, também, por um controverso cenário político. Denúncias por suspeitas de corrupção e improbidade administrativa, afastamentos e cassações de direitos políticos. Esses fatores contribuíram para que apenas cinco dos 17 mandatos municipais fossem cumpridos nos últimos 37 anos.
Seria a política pacajuense uma continuação das práticas oligárquicas presentes no período República Velha? Por que determinados grupos políticos, mesmo tendo um histórico de denúncias e cassações de mandatos, ainda conseguem ser eleitos? Essa é uma particularidade da política pacajuense ou é uma prática nacional?
Para construir um traçado da história política pacajuense, compreendendo os mecanismos de fazer política no Brasil e explicando os "fenômenos" do tema em Pacajus, este trabalho faz um levantamento histórico de acontecimentos e fases do sistema governamental da cidade.



A cada três prefeitos eleitos, dois, em média, são cassados em Pacajus
A última cassação foi em 2017, de Flanky Chaves, por suspeita de corrupção
(Foto: Reprodução/Jornal O Povo)
Assim como em suas origens, a cidade de Pacajus, enquanto representação política, desde a década de 1980, enfrenta entraves jurídicos e dezenas de investigações na Justiça contra seus prefeitos e vereadores. A situação teve início entre 1984 e 1985, quando o então prefeito do município, José Wilson, foi afastado pelos vereadores com o placar de dez votos a cinco, por suspeita de corrupção administrativa.
Por continuidade, desde lá, em 37 anos, 12 políticos diferentes estiveram à frente da Prefeitura. Somente quatro deles, até onde se sabe, não se envolveram em desvios de recursos públicos. Apenas Assis Benício, Orlando Lourenço, Fan Cunha e Marcos Paixão não foram cassados ou afastados do cargo de prefeito, sendo que Fan Cunha, que governou entre 2004 e 2008, foi condenado quase uma década depois a devolver dinheiro referente a desvios quando prefeito. Assim, apenas três governantes, a partir da década de 1980, conseguiram cumprir mandatos
De acordo com Marcos Vicente, doutorando em História pela Universidade Estadual do Ceará (Uece) e natural da cidade, a situação não passa de uma continuidade do período imperial. "A política durante o período colonial era uma violenta, de destituição de governadores e de prefeitos. A continuidade dela hoje é uma herdeira direta de uma política do século XIX e do começo do século XX. Nas pequenas cidades do Brasil, como Pacajus, isso ainda permanece muito forte. Pouquíssimas mudanças ocorreram na forma de fazer política do passado e de hoje. Sempre são dois grupos políticos que se revezam e se perpetuam no poder", afirma.
Família Amaral Chaves
"É o Zé que o povo quer. É no Zé que o povo vai votar. É o 11 da nossa felicidade. O Zé voltou foi pra ficar. É o 11!", entoa o carro de som. O jingle exposto representa a conexão entre José Wilson, seu partido e seus eleitores. Antes filiado ao Arena, o partido da Ditadura, o histórico representante popular ficou conhecido pela coligação ao Partido Progressista (PP), com o número 11, que foi herdado pelos filhos, incluindo Flanky Chaves, o último prefeito cassado do município.
A boa relação com a população, mesmo com o histórico conturbado apresentado na linha do tempo, deve-se, de acordo com Cleyton Monte, doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), às obras e às realizações que se fixam na "cabeça do eleitor". Reformas como a do Complexo Turístico Beira Açude, a da Praça Carlos Jereissati (Praça do Tintim) e a do entorno da Igreja Matriz estão vivas na memória dos pacajuenses que defendem José Wilson.
É o que também afirma Emanuel Freitas, doutor em Sociologia pela UFC. Segundo ele, ocorre uma confusão entre os "favores" da classe política e a política de Estado. "Embora essas famílias, na maioria das vezes, sejam ligadas à prática da corrupção, elas também são famílias que trabalham pela sua cidade. E a forma que elas encontram para inscreverem-se na memória do eleitor nos confunde enquanto cidadãos, gerando dificuldades não só para a própria classe política, mas em nós também, que é a dificuldade de separar o público do privado", pontua.
No clã da família, além de José Wilson, a esposa dele, Helena Chaves, seu pai, Expedito Chaves, e até mesmo seu filho, Flanky Chaves, foram afastados da prefeitura por corrupção ou improbidade administrativa. Os populares que são contrários à idolatria do ex-prefeito asseguram que a permanência dos "Chaves" no poder atrasa o município.
Família Philomeno Figueiredo
Pedro José, prefeito de Pacajus que foi preso entre 2008 e 2011, é um dos empresários de maior sucesso na cidade. Ele é proprietário da Sucos do Brasil S/A, antiga Jandaia, e que movimenta cifras milionárias no município, exportando produtos para todo o País. Ele já foi aliado e apoiou financeiramente José Wilson.
Os dois, inclusive, estiveram juntos na chapa de seus filhos, Flanky e Bruno, na eleição de 2016. No entanto, os filhos brigaram no início do mandato e romperam politicamente durante a gestão, especialmente após a cassação de Flanky Chaves. O troca-troca de prefeitos não é bem avaliado entre a população. "É uma vergonha essa situação. Pacajus hoje vive de traição, com prefeito e vice se traindo e traindo as outras pessoas", constata Tintim Menezes, farmacêutico e vice-prefeito da cidade entre 2013 e 2016.
Posicionamento do MPCE
O caso de afastamento de Flanky Chaves foi conduzido pelo promotor de Justiça Iuri Rocha Leitão. Atualmente, ele atua na Comarca de Maracanaú. Esta reportagem entrou em contato com a Assessoria de Comunicação do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), para o órgão falar sobre os casos de mandatos inacabados na Prefeitura de Pacajus. O promotor Iuri Leitão, no entanto, prefere não comentar o assunto.


Da esquerda para a direita, Flanky Chaves, Tasso Jereissati e José Wilson. Os três simbolizam duas oligarquias diferentes no Ceará, a da família Amaral Chaves e a oligarquia Jereissati. (Foto: Reprodução/Facebook)

Da esquerda para a direita, Bruno Figueiredo e seu pai, Pedro José, intercalados por apoiadores na Câmara Municipal de Pacajus. O retrato é de setembro deste ano, na segunda posse de Bruno após o retorno da suspensão de Flanky.
(Foto: Reprodução/Facebook)
Podcast
A fim de obter uma visão especializada no assunto Oligarquias Políticas no Nordeste, a seguir, tem-se um bate-papo com a participação dos cientistas políticos Cleyton Monte e Emanuel Freitas. O podcast abaixo busca dar ênfase na reflexão acerca dos casos de mandatos inacabados na Prefeitura de Pacajus, na Região Metropolitana de Fortaleza.